sábado, 8 de março de 2014

A Máquina do Mundo


E como eu palmilhasse vagamente 

uma estrada de Minas, pedregosa,


e no fecho da tarde um sino rouco 



se misturasse ao som de meus sapatos 


que era pausado e seco; 


e aves pairassem no céu de chumbo,


e suas formas pretas 



lentamente se fossem diluindo


na escuridão maior, vinda dos montes


e de meu próprio ser desenganado,

A máquina do mundo se entreabriu 


para quem de a romper já se esquivava


e só de o ter pensado se carpia.



Abriu-se majestosa e circunspecta,


sem emitir um som que fosse impuro


nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção


contínua e dolorosa do deserto,


e pela mente exausta de mentar




Toda uma realidade que transcende 


a própria imagem sua debuxada 


no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando


quantos sentidos e intuições restavam


a quem de os ter usado os já perdera



e nem desejaria recobrá-los,


se em vão e para sempre repetimos


os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,


a se aplicarem sobre o pasto inédito


da natureza mítica das coisas. 

O nome dos Poetas Brasileiros devem está na


boca do povo!
(Trecho de A Máquina do Mundo, de Carlos 
Drummond de Andrade).

Nenhum comentário:

Postar um comentário